Entre memórias de família, música e resistência, Cristal constrói uma das trajetórias mais autênticas da nova geração da música brasileira. Em entrevista exclusiva, a artista gaúcha abriu o coração sobre suas origens, o impacto da negritude em sua arte e o poder do afeto como registro histórico.
“‘Southside’ vem de um lugar dentro de casa. A negritude, a militância na minha carreira sempre vieram de dentro. O samba, o reggae, os compositores negros sempre estiveram presentes nos encontros de família. O churrasco de domingo era um momento de troca, de escuta, de celebração da nossa história”, contou a cantora, emocionada.
Para Cristal, esses momentos de convivência são parte de uma militância cotidiana e também o ponto de partida da sua expressão artística. “Quando olho pra esses finais de semana, vejo que ali está a maior forma de resistência. Mesmo que nossa história não esteja em todos os livros, ela está viva na minha família. A população negra fez parte da construção de muitas cidades e é isso que quero mostrar”, diz.
A artista lembra que o despertar para a arte veio cedo, ainda na adolescência, quando participou de batalhas de poesia e slams em Porto Alegre. “Eu comecei aos 15 anos, mas sempre fui uma criança artista. Quando recitei pela primeira vez no slam, em 2017, vi pessoas diferentes se identificando comigo. Ali entendi o poder da palavra e percebi que podia inspirar outras pessoas.”
Mais do que cantar, Cristal enxerga a música como uma forma de documentar a existência. “Pessoas pretas têm o direito de ter uma história pra além do sofrimento. A música é uma maneira de registrar sentimentos e deixar um legado. O afeto também é um fato histórico”, reflete.
Ao falar sobre o cenário musical no Rio Grande do Sul, a cantora é firme: ainda há muito a ser feito. “O Sul não é visto como Brasil. E quem mais sofre com isso são as pessoas pretas, indígenas, quilombolas. Quando se fala de música gaúcha, lembram do tradicionalismo e esquecem quem veio antes, quem construiu cultura. Eu canto pra mudar isso, pra mostrar que existimos, resistimos e criamos.”
Hoje, vivendo em São Paulo, Cristal segue explorando novas sonoridades e fortalecendo sua voz com liberdade e propósito. “Depois de tudo que vivi, quero ousar, brincar com a minha voz e seguir fazendo da música um espaço de memória e de amor”, finaliza.
